A mudança de rotina pode ser um complicador para pessoas com o Transtorno do Espectro Autista, alerta neuropsicóloga da Singular Medicina de Precisão
A Organização das Nações Unidas (ONU) definiu o dia 02 de abril como Dia Mundial de Conscientização do Autismo, com o objetivo de chamar a atenção da sociedade para o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). O autismo é uma alteração do desenvolvimento neurológico presente desde o nascimento ou começo da infância. Pessoas dentro do espectro autista podem apresentar dificuldade para interagir socialmente, dificuldade na comunicação, alterações comportamentais, como manias, apego excessivo a rotinas, pouca flexibilidade no dia a dia, ações repetitivas, interesse restrito em coisas específicas, dificuldade de imaginação ou abstração e sensibilidade sensorial (podendo ser hipo ou hiper sensibilidade), como hiperacusia (sensibilidade maior aos sons). Segundo estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil pode ter mais de 2 milhões de autistas.
Diante da necessidade de isolamento social, indicação da OMS para conter o avanço do Coronavírus, a maior dificuldade para pessoas com TEA neste momento é a mudança de rotina, alerta a neuropsicóloga da Singular Medicina de Precisão, Andrea Bahia. “Neste período o maior impacto é o fato de não poder cumprir a rotina que tinham antes. Mesmo assim é possível, através de algumas estratégias, ajudá-los neste processo. Começar por informações explícitas e claras, usando imagens, textos, guias de fontes seguras. A seguir, mostre as orientações para este período e de forma concreta e visual, construa uma nova rotina. É fundamental para estas crianças que o máximo da rotina anterior seja mantida”, sugere.
Origem do TEA
Neupediatra com atuação no campo da neurogenética, Emília Embiruçu destaca que as causas para o aparecimento do TEA são multifatoriais. Mas já se sabe que dois pontos devem ser levados em consideração: “uma predisposição genética e a interação com fatores ambientais podem ocasionar o aparecimento do TEA” alerta a médica. Essa predisposição genética pode ocorrer através de mutações espontâneas no desenvolvimento do feto e a herança genética passada de pais para filhos.
Julieta Góes também é neuropediatra e atua com transtornos cognitivos e transtornos do espectro autista e reforça que as causas hereditárias explicariam uma parte do risco de desenvolver TEA. Ela destaca os fatores ambientais que podem afetar o feto: “Estresse, infecções, exposição a substâncias tóxicas, complicações durante a gravidez e desequilíbrios metabólicos teriam papel importante no aparecimento do TEA”.
Os avanços tecnológicos na área da neurociências têm cada vez mais apresentado informações sobre as causas do TEA. Um aliado da investigação é a realização de testes genéticos – principalmente nos casos de crianças com autismo e outras manifestações neurológicas associadas (como deficiência intelectual ou epilepsia). Os resultados podem orientar o tratamento de forma mais específica, além de possibilitar o aconselhamento genético, planejamento familiar e melhor conduta prognóstica.
Após diagnóstico médico, a primeira coisa a ser feita é definir o plano de tratamento personalizado de acordo com as necessidades da criança. O tratamento é multidisciplinar e pode envolver vários profissionais, como pediatra, neurologista, psiquiatra, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, psicólogo, educador físico, entre outros. E quanto mais precoce o diagnóstico e a intervenção multiprofissional na reabilitação, melhor será o prognóstico da criança na adaptação social, escolar e desenvolvimento de habilidades.
Como Identificar?
Nas crianças identificadas com TEA, é possível observar um desenvolvimento diferente do que seria esperado para sua idade. Isso pode variar, segundo Julieta, na maneira e intensidade em cada pessoa. Entre os sintomas, destacam-se o atraso para começar a falar, dificuldade para olhar nos olhos, não atender ao chamado do nome, não apontar, não brincar com crianças da mesma idade, não entender linguagem figurada, brincar com brinquedos de maneira incomum (ex: ficar girando a roda de um carrinho), demonstrar maior interesse por objetos do que por pessoas, realizar movimentos repetitivos, choros inapropriados, sensibilidade a sons e aparentar indiferença ao toque.
A Sociedade Brasileira de Pediatria orienta que toda criança seja avaliada para TEA entre 18 e 24 meses de idade, mesmo que não tenha sinais clínicos evidentes de outros atrasos do desenvolvimento. Em algumas crianças, mesmo antes dessa idade podem ser percebidos sinais importantes. “O diagnóstico de TEA é clínico, ou seja, não existe um exame laboratorial ou de imagem que possa comprovar a presença do transtorno. Ele deve ser realizado por um profissional de saúde especializado, como um neuropediatra ou psiquiatra infantil. O diagnóstico do TEA depende de uma avaliação completa da criança, entrevista com os pais e ou cuidadores e associado ao uso de escalas validadas”, explica Julieta.
Para a neuropsicóloga Andrea Bahia, atualmente existem instrumentos importantes para a identificação do TEA: “Contamos com ferramentas que incluem testes e escalas, que contribuem para a identificação do transtorno e seus sintomas. Por consequência, diretrizes para a condução do tratamento através do uso de métodos científicos para estimular ou compensar o desenvolvimento das habilidades de forma precoce”. Importante lembrar que é comum encontrar crianças no Espectro com altas habilidades: “É muito importante que isso seja levado em conta, valorizando e incentivando áreas em que esta criança possa explorar. Há crianças que possuem excelente memória e é comum terem não apenas interesse, mas facilidade com desenho, por exemplo. Possuem características mentais que em muitos contextos são preciosas. O bom aproveitamento dessas habilidades depende de um bom acompanhamento e condução ao longo do seu desenvolvimento”, ressalta Andréa.